28 de ago. de 2008

29º ANIVERSÁRIO DA LEI DE ANISTIA.

Depois de quinze anos de regime militar, onde o arbítrio e a prepotência preponderaram, em 28 de Agôsto de 1979, o Congresso Nacional aprovava a lei de Anistia Política, possibilitando a abertura das prisões políticas e o retorno dos brasileiros que estavam exilados ou banidos do território nacional.
E não eram poucos!
Por diversas razões, brasileiros encontravam-se encarcerados. Delamare Machado da Silva, que morou em nossa Bauru por inúmeros anos, foi preso e condenado com base na Lei de Segurança Nacional por montar o Comitê de Solidariedade Revolucionária, com o intuito de organizar uma rede de apoio aos presos políticos. Ricardo Zarattini Filho por ousar retornar clandestino e atuar politicamente contra o regime militar, depois de ter sido trocado com o embaixador norte-americano. Aldo Arantes, por insistir em manter organizado o PcdoB. Pelos mesmos motivos, milhares de brasileiros encontravam-se no exterior, impedidos de retornarem para a pátria, dentre eles, o falecido José Ivan Gibin de Matos e o sargento Darcy Rodrigues, companheiro de armas e de luta do saudoso Capitão Carlos Lamarca.
Com a Lei de Anistia aprovada, paulatinamente, os brasileiros que se encontravam alijados da vida em comunidade foram retornando, saindo das prisões ou da clandestinidade, como no caso do bauruense adotivo, José Duarte.
Decorridos 29 anos da sua aprovação a Lei de Anistia ainda não foi cumprida em sua plenitude e aqueles que perderam seus empregos por motivação política ainda lutam para reavê-los, em processos intermináveis no Ministério da Justiça. Quando conseguem a vitória, ainda são obrigados a ouvirem que irão receber indenizações milionárias, quando na realidade, estão recebendo salários atrasados e sendo solapados em mais de vinte anos de direitos trabalhistas. Afinal, o governo somente paga os atrasados referente aos cinco anos anteriores a solicitação de anistia. O anistiando adentrou com o pedido em 2002, logo depois da aprovação da Lei, terá direito aos atrasados de 1997 em diante, não se considerando o período entre 1964 até esta data. Os familiares de mortos e desaparecidos continuam na luta, na busca constante e sem sucesso de localizarem os restos mortais de seus entes queridos, entre eles, os dos bauruenses, Jaime e Lúcio Petit da Silva.
Hoje, juristas de todo o Brasil clamam pela punição aos torturadores que atuaram durante o regime militar e vozes levantam-se afirmando que a anistia foi para ambas às partes envolvidas.
Não, não foi, mesmo porque a tortura é considerada como crime imprescritível e não poderiam ter sido anistiados, aqueles que torturaram. Na realidade, a tortura é um verdadeiro crime de lesa humanidade com a agravante de ter sido largamente praticada em nossa Pátria com a finalidade de reprimir o chamado “crime de opinião”.
Aqueles que continuam com seus processos de anistia sendo analisados no Ministério da Justiça, esperam de forma paciente a resolução de seus litígios e hoje, em idade avançada, esperam poder morrer da mesma forma com que viveram, ou seja, com dignidade.
Neste 28 de Agôsto, no Memorial da Resistência, localizado no antigo prédio do DOPS em São Paulo, o Fórum Permanente dos Ex-Presos e Perseguidos Políticos de São Paulo estará realizando evento durante todo o período da tarde para relembrar os anos de chumbo no Brasil e no período da manhã, às 11:30 horas, na Faculdade de Direito do Largo São Francisco, um grupo de renomados juristas estará lançando um manifesto, onde defendem a punição dos torturadores e sua responsabilização pelo pagamento pecuniário devido as suas vitimas.
Lá estaremos, com orgulho.

21 de ago. de 2008

29º Aniversário da Lei de Anistia

29 anos da Lei de Anistia - Verdades e Mentiras - 28/08
Democratizacao e abertura
dos arquivos politicos

No auditorio do Memorial da Resistencia (ex- DEOPS- Largo General Osorio), a partir das 13:30 h

Durante toda a tarde desse dia, serao discutidos temas como:

- A impunidade dos que perpetraram crimes de lesa-humanidade no Brasil;
- A historia da promulgacao da Lei de Anistia em 1979;
- A experiencia da abertura dos arquivos do DEOPS-SP;
- Os documentos que fazem parte do acervo do DEOPS, relacionados com a Lei de Anistia;
- Os documentos do Projeto Brasil Nunca Mais, do arquivo Edgard Leuenroth;
- O novo projeto do Memorial da Resistência.

O Seminario contara com participacao de eminentes figuras publicas e privadas e tem o apoio do Grupo Tortura Nunca Mais de Sao Paulo, assim como da Comissao de Familiares de Presos Politicos Mortos e Desaparecidos.

Abaixo, o programa completo desse importante evento. Pedimos a todos que ajudem na sua divulgacao.

PROGRAMA


13:30 - Abertura e coordenação da mesa – Raphael Martinelli – Presidente Forum

13:40 - Palavras do Diretor da Pinacoteca – Dr. Marcelo Araujo

13:50 - Palavras do Secretario-Adjunto da Secretaria da Cultura - Dr. Ronaldo Bianchi

14:10 - Palavras do Secretario da Justiça – Dr. Luiz Antonio Marrey

14:30 - Exposição da Dra. Eugenia Augusta Favero - Procuradora da Republica
Crimes da Ditadura - Ainda é possivel punir?

15:00 - Exposicao do Dr. Airton Soares – Ex-Deputado Federal e advogado
A verdadeira historia da aprovacao da Lei de Anistia

15:30 - Palavras do Dr. Paulo Abraão – Presidente da Comissao de Anistia do Ministerio da Justica

16:00 – Intervalo de 30 minutos


16:30 – Exposicao do Dr. Carlos de Almeida Prado Bacelar,
Coordenador do Arquivo Publico do Estado de Sao Paulo
O Arquivo Publico do Estado e o acervo DEOPS-SP:
A liberacao da memoria politica, uma experiencia democratica.

17:00 - Exposicao da Profa. Maria Luiza Tucci Carneiro,
Coordenadora do Projeto Integrado Arquivo Publico do Estado/USP- PROIN
Desarquivando a Anistia: Arquivo DEOPS

17: 30 – Exposição de Ema Franzoni, sociologa, equipe tecnica
O acervo documental do projeto Brasil Nunca Mais, depositado no Arquivo Edgard Leuenroth.

18: 00 - Exposição da Profa. Cristina Bruno, vice-diretora do Museu de Arqueologia e Etnologia da USP
O novo projeto do Memorial da Resistencia

18:30 - Sessao de perguntas e respostas

19:30 – Encerramento

11 de ago. de 2008

ANISTIA E OS CRIMES DE LESA HUMANIDADE

A discussão sobre a revisão da Lei da Anistia de 1979 é falsa e serve para desviar a atenção do real assunto que entrou em pauta após as famílias Telles e Merlino, bem como o Ministério Público Federal moverem ação cível contra o Cel. Carlos Alberto Brilhante Ustra e outros responsáveis pela tortura e desaparecimento forçado no DOI-CODI de São Paulo, trazendo à tona os conceitos que estão em jogo e que definirão os rumos da construção do estado democrático de direito no Brasil e o desenvolvimento da cultura do Nunca Mais em nossa sociedade.
A ONU e a Corte Interamericana de Direitos Humanos através de estudos na área da Justiça Transicional definem quatro conceitos fundamentais para avaliação da transição de um regime ditatorial para um democrático, visando que a cultura do Nunca Mais se instale na sociedade. O direito a verdade, a não impunidade, a reparação e a mudança das estruturas, conceitos e atuação dos organismos de segurança pública, são os pilares que garantem esta transição e devem ser desenvolvidos, simultaneamente, como condição para garantir a cultura do Nunca Mais.
O Procurador Regional da República do Ministério Público Federal Marlon Alberto Weichter em palestra proferida em dezembro passado, aponta que o Estado brasileiro está inadimplente em três das exigências da ONU, exacerbando a reparação como forma de escamotear a não abertura dos arquivos, a impunidade aos crimes de lesa humanidade e a manutenção de estruturas, conceitos e forma de atuar dos organismos de segurança pública.
O Brasil é signatário de tratados internacionais que desenvolveram o conceito normativo dos crimes de lesa humanidade, tais como a Convenção de Haia, ratificada em 02 de janeiro de 1914 e o Estatuto do Tribunal de Nuremberg ratificado em 21 de setembro de 1945 por ocasião da entrada do Brasil na ONU, onde no artigo 6c são qualificados como crime dessa qualidade os atos desumanos cometidos contra a população civil, a perseguição por motivos políticos, o homicídio, o extermínio e a deportação, dentre outros. Dessa forma, o Brasil tem integrado ao seu sistema jurídico o conceito de crime contra a humanidade, o que obriga os estados membros da ONU a promover a punição de torturadores, como o Cel. Ustra bem antes do golpe de 1964.
O Estatuto de Roma ratificado pelo Brasil em 24 de setembro de 2002, em seu artigo 7 classifica a tortura como crime contra a humanidade e portanto, não possue cobertura jurídica da Lei da Anistia, definição adotada também pela Convenção Interamericana de Direitos Humanos, cuja jurisdição é reconhecida pelo Estado brasileiro.
As graves violações aos direitos humanos que aconteceram durante o período da ditadura militar foram reconhecidas oficialmente pelo Estado brasileiro através do livro Direito à Memória e à Verdade publicado pela Secretaria Especial de Direitos Humanos, o que leva a justiça em nosso país, pela devida obediência aos tratados e acordos internacionais ratificados, apurar e punir os autores de tais fatos.
Os Ministros Tarso Genro e Paulo Vannuchi realizaram em Brasília a Audiência Pública “Limites e Possibilidades para a Responsabilização Jurídica dos Agentes Violadores de Direitos Humanos durante Estado de Exceção no Brasil”, onde não se discutiu a revisão da Lei da Anistia, mas sim a distorção imposta aos brasileiros de que tortura é crime passível de anistia. Tortura não é crime político, nem tampouco comum e sim crime contra a humanidade, portanto imprescritível.
Quando perguntado ao presidente do Clube Militar, General Gilberto Barbosa Figueiredo, em entrevista publicada no sitio da instituição, se este é o momento de retomar esta discussão; ele argumenta "Não, acho que não. Pois o caminho que estávamos seguindo era de convergência, de harmonização. Esse foi o sentido da Lei de Anistia."
Teotônio Vilela que presidiu os trabalhos para a criação desta lei, deixou publicado em livro para a história através do Senado Federal, “um roteiro de como as coisas aconteceram” do começo ao final e é nítido que a legislação foi imposta através de mecanismos de controle parlamentar, como o esvaziamento das sessões em que propostas de alterações trazidas pelos membros do MDB foram sistematicamente rejeitadas e não discutidas. Através da maioria parlamentar, a ARENA votou o que os militares queriam para realizar a distenção e saírem impunes dos crimes que cometeram no período. “Ficou exclusivamente a proposta oficial” diz o Senador no prefácio do livro.
Das 306 emendas ao projeto de lei, o MDB apresentou 210, ou seja 68,63% e somente 19,52% foram aprovadas, sendo que a sua maioria em parte e conforme o texto do relator, o que reduz para muito pouco as alterações na proposta enviada pelo Gen. Figueiredo produzidas no difundido “diálogo” com a sociedade e a oposição, a despeito de todo o movimento pela Anistia – Ampla, Geral e Irrestrita. A charge publicada à época por Luiz Gê, diz o mesmo, mas mesmo assim não se trata de rever a Lei 6683 / 79. A falsa discussão da revisão da Lei da Anistia encobre a questão central, que é o desrespeito pelo Estado brasileiro da legislação internacional à qual estamos todos submetidos, que classifica a tortura como crime contra a humanidade, perpetuando o sentimento de impunidade, que é o esteio desta tão nefasta prática presente hoje em todos os estados brasileiros, conforme apontam relatórios da Justiça Global e Anistia Internacional publicados recentemente sobre a tortura e violações dos direitos humanos no Brasil.
A democracia brasileira não pode prescindir da abertura dos arquivos para exercer o direito a verdade, da localização dos desaparecidos políticos para afirmar a cidadania, da apuração e julgamento das violações aos direitos humanos para inibir a cultura e pratica da tortura e da revisão da política de segurança pública para efetivamente consolidar o estado democrático de direito, que respeite a todos os cidadãos e em todo o território nacional. Estes são nossos desafios como nação para termos um Nunca Mais.A paz é fruto da justiça e não do esquecimento!
Marcelo Zelic Diretor do Grupo Tortura Nunca Mais–SP e membro da Comissão Justiça e Paz da Arquidiocese de São Paulo.