24 de fev. de 2015

A IGREJA NA RESISTÊNCIA DEMOCRÁTICA

Não sou religioso e desta forma, não frequento templos. Entretanto, gosto de ler e sempre aprendo alguma coisa. Estou lendo sobre o estudante Alexandre Vannuchi Leme, jovem estudante de geologia da USP, morto sob tortura durante o regime militar.  Militante da Ação Libertadora Nacional – ALN -,  era oriundo de tradicional família católica de São Paulo e nestas leituras tenho encontrado posicionamento  de religiosos contra a ditadura e principalmente, seus métodos medievais de tortura para se obter confissões. D. Helder Câmara, arcebispo de Olinda e Recife, notabilizou-se durante o regime militar pela defesa intransigente da liberdade, da democracia, dos direitos humanos pelo fim das torturas dos opositores ao regime militar, era chamado pelos agentes da ditadura de “ bispo vermelho” e de “ Fidel Castro de batina”. Respeitado internacionalmente, enchia auditórios mundo afora, onde denunciava as arbitrariedades dos militares encastelados no poder. A imprensa brasileira era proibida de citar seu nome e nem criticas a sua atuação podiam ser publicadas.
Certa vez, declarou:
“ Quando dou comida aos pobres, me chamam de santo; quando pergunto por que eles são pobres, chamam-me de comunista”.
Outro bispo que se notabilizou na luta contra a tirania foi o Bispo de São Felix do Araguaia, D Pedro Casaldaliga, com presença constante na defesa dos oprimidos. Como forma de denúncia, escreveu “ Salmo de São Felix do Araguaia”:
“ Livra-me, Senhor,
Do DOPS, da Oban e Codi, do SNI
Livra-me de seus conselhos de guerra
Da ira de seus juízes e seus guardas
Tu julgas as grandes potências
Tu és o juiz que julga os ministros da justiças
E cortes supremas de justiça
Defende-me, Senhor, do processo falso
Defende os exilados e deportados
Os acusados de espionagem
E de sabotagem
Condenados a trabalhos forçados
As armas do Senhor são mais terríveis
Que armas nucleares
Os que roubam serão roubados
Mas eu cantarei a  Tí  porque és justo
Cantar-Te em salmos
Em meus poemas”.
D. Paulo Evaristo Arns foi outro que não se escondeu debaixo, durante a ditadura militar, e sempre esteve presente, apoiando os movimentos populares de oposição e visitando com constância os presos políticos, oferecendo-lhes apoio espiritual e o conforto de uma amizade terna e amiga. Múltiplas passagens, encontramos a respeito da atuação deste abnegado defensor da justiça e da liberdade de expressão, entretanto, vamos nos ater a um trecho de sua homilia na missa realizada na Catedral da Sé, em São Paulo, quando do translado dos restos mortais de Alexandre Vannuchi Leme, para Sorocaba e de Frei Tito de Alencar, para Fortaleza, cerimonia esta realizada em 25 de março  de 1983:
“ Senhor, Deus da libertação, que nos assegurais, por vossa ressureição, a certeza da vida e da vitória, nós, aqui reunidos diante das cinzas de Alexandre e de Frei Tito, firmamos o compromisso:
- de nunca deixar que se apague a memória deles e de todos que foram assassinados pela repressão;
- de prossegui lutando pela mesma esperança, com a mesma dignidade e coragem;
-de participar dos movimentos populares, das causas por mais justiça e liberdade;
- de reforçar nossa união e nossas ferramentas de luta;
- de servir à causa libertadora dos oprimidos, assim como o fizeram Alexandre e Tito e o vosso filho Jesus. Amém”.
Escolhemos estes três religiosos com a finalidade  de homenagear todos aqueles que ousaram lutar contra a tirania e a opressão, em um período obscuro da história politica brasileira e que alguns, teimam em querer de volta. Poderíamos falar de D. Candido Padin e tantos outros que não se acovardaram diante dos coturnos que mancharam de vermelho, do sangue de patriotas, o verde de nossa bandeira.
Para finalizar, vamos de Chico Buarque, em Sonho Impossivel:
“ Sonhar
Mais um sonho impossível
Lutar
Quando é fácil ceder
Vencer
O inimigo invencível
Negar
Quando a regra é vender
Sofrer
A tortura implacável
Romper

A incabível prisão”.